sábado, 13 de julho de 2013

superamor

Olhei para você, no escuro do cinema, e percebi uma lágrima discreta, que escorria na sua bochecha rosada por conta do frio, enquanto seus olhos acompanhavam a história na tela. Sua mão pequena segurou a minha, você se aproximou do meu ouvido e pediu para sentar no meu colo. Eu te acolhi da melhor maneira. Encaixei sua cabeça entre meu pescoço e meu ombro e você terminou o filme ali, no colo quentinho da sua tia. Quando acenderam a luz, você, já de pé, chegou perto e disse: "Chorei, mas foi só um pouquinho tá?". Eu me vi pequena, de coração na mão, diante de você que só tem 7 anos, calça 32, usa tênis do Superhomem e me desmonta.

Quis te explicar que meninos também choram. Dizer que você é livre, meu amor, para sentir o que quiser ou tudo aquilo que não puder evitar. Só consegui dizer: "Também chorei, amor. Foi tão bonito né?". E você balançou a cabeça com um jeito de quem entendeu que se emocionar é tão bonito que nem sobra espaço para sentir vergonha ou se justificar. Você ficou sensibilizado quando o Sulley, o monstrengo azul desajeitado, decepcionou o amigo Mike, que ficou arrasado porque descobriu que não era assustador o suficiente para continuar na Universidade Monstros. Mike era simpático e boa praça demais para assustar criancinhas. E eu esqueci do filme e fiquei assistindo a você sentir. 

Que a doçura não se perca totalmente nas brechas do tempo. A vida deixa a gente um pouco mais duro e isso é bom pela questão da sobrevivência. Mas se essa capacidade vai embora totalmente e a gente vira um amontoado de ambição e defeitos, não sobra muito que valha a pena compartilhar. Seu jeito de enxergar o mundo é lindo, meu amor. Guarde sempre um pouco disso com você, que hoje é puro bem. Te encontrar ali tão frágil, me fez lembrar de outro momento. 

A gente voltou da piscina e te coloquei no banho. Você me perguntou se axilas era uma palavra em inglês e me pediu para chamar de suvaco mesmo, que era mais legal. Complicar porquê? Enquanto eu enxaguava o sabão dos seus braços e morria de rir, você me olhou de um jeito tão bonito, bem no fundo do olho. "Tia, você me ama. Sabe como eu sei? Porque você cuida de mim igual à minha mãe". E meu riso mudou, porque achei fantástico. Apesar de parecer tão óbvio, não era. Eu quis chorar, porque percebi que você já tinha uma ideia linda do que era amor.

Amar, aliás, é com você mesmo. Me contou todo orgulhoso que o veterinário disse que você salvou uma vida. "Peguei o gatinho, que tava cheio de pereba, tremendo na rua. Dei leite e comida. O médico disse que ele ia morrer. Agora tenho dois dois filhos (era a segunda vez que você adotava um bichinho)". A história te rendeu uma semana de pereba de gato, mas você nem se importou. Estava muito feliz por ser um salvador.
Sempre cheio de dúvidas, em uma tarde dessas, você quis saber porque alguns são negros e outros brancos. Te contei que a gente é um pouco de cada um, aqui no Brasil, inclusive você, com seus olhos verdes e pele cor de leite. Porque um adulto da TV disse algo ruim sobre "gay"? O que tem na Disney? Quem foram os Beatles? Vamos cantar Hey, Jude?

Outro dia, você fez um desenho para mim. Eu e você não tínhamos pescoço, nem proporções humanas. Aquele é um dos meus retratos preferidos, um dos mais fiéis, de mim. Meio torta, faltando um monte de coisa, diferente e com um sorriso tão grande, mas tão grande, que quase não cabia no papel. Meu sorriso bobo é um reflexo da sua presença que, sem qualquer pretensão, revela o melhor de cada dia comum.

Nenhum comentário: