Qualquer passado cabe na moldura da fotografia. Olhos que te amaram não te enxergam mais. Bocas que te beijaram misturam as letras do seu nome com as do nome de outro alguém. Seu gosto desapareceu, ficou gasto com o tempo, como o amor, como as ideias mutantes. Seu sabor envelheceu como o futuro, que um dia foi sonho. E a vida vai sem freio. Pensar nos dias que virão é como ver um filme. As emoções, os planos, todo o roteiro que jamais sairá da tela.
Fazer aniversário é receber um recado do universo: parabéns, você chegou até aqui. O rio correu e a água não secou. Você escreveu algumas linhas a mais na sua história, sem possibilidades de edição. Envelhecer faz pensar no que você planejou. Onde imaginou estar aos 30? Aos 40? A gente traça um caminho. A vida segue sozinha por onde quer. Não pede licença, desconhece o "por favor". Com sorte e uma pitada de bom senso, é possível manter-se fiel a si mesmo.
Basta olhar para as pessoas ao redor. Mudam os amigos, os amores, os hábitos, a roupa do corpo e o que te cobre a alma. Troca-se de casa, de paladar, de preferências, de humor, de música. Pensar no passado é como viver a vida de outra pessoa. Talvez ela seja mais feliz hoje do que jamais imaginou ser. Quem sabe. A vida é tão feita de passado quanto de presente. O futuro a gente sonha. Lapida. Depois sonha de novo.
O que fica, no fim, no epitáfio, na poeira cósmica, são as pessoas, os momentos nos quais você se entregou e só por isso teve paz. Como quando você se sentiu inteira porque ele disse "eu te amo" com os olhos. A sensação de liberdade que é cantar sem afinação e sem julgamento, com a janela do carro aberta e o vento ressecando a boca. Amor é o desejo de dar o melhor do mundo servido em uma bandeja para os irmãos mais novos (porque ver alguém crescer tem sua mágica) e para os amigos menos experientes. Querer poupá-los de todo o mal, mesmo sabendo que não seria certo. Amor é o bem que mora em você e de tão vivo que é poderia ter cheiro, rosto e gosto. No resultado da soma dos anos, tudo que se quer é ser apresentado à única verdade entre o espaço de nascer e morrer: o amor. Desistir de se encantar é morrer. Parabéns para nós, que estamos vivos.
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